Rosa no sebo

15:12

Ah, o sebo. Ela adorava sebos! Quando conheceu um, se apaixonou, e tal paixão dura até hoje.
Escondia-se atrás das estantes repletas de livros de páginas amareladas, respirava aquele cheiro familiar e se sentia em casa. Visitava semanalmente um sebo muito agradável, que possuía mesinhas e uma pequena cafeteria para o deleite dos leitores ávidos, como ela. Costumava empilhar livros nessas mesinhas, se sentar, e analisar quais deveria ou não comprar. Normalmente ela era uma leitora solitária, mas nos últimos meses, o sebo também havia sido visitado por um homem, de aparentemente 25 anos.
Ela estava bastante incomodada com tal homem. Quem ele achava que era, para invadir seu recanto particular, atrapalhar o silêncio e bagunçar seu momento de prazer?
A irritação era ainda maior quando ela percebia que ele a encarava. E pior: não disfarçava! Se ela o olhava, ele sustentava e não movia o olhar, até que ela mesma se cansava e voltava à leitura. Até a respiração dele a incomodava. Pesada e longa, era praticamente um suspiro repetido infinitas vezes. Ah, e tinha o perfume! Aquele perfume delicioso, que a impedia de prestar atenção em sua leitura. Porque ele não se esquecia ao menos um dia de passar perfume?
Repentinamente, após semanas que seguiram o roteiro (ele cheiroso, respirando fundo e encarando, e ela terrivelmente incomodada) ele falou:
- A muito tempo estou tentando analisar que tipo de leitora você é.
Ela olhou em volta, e percebeu que, como não havia mais ninguém por perto, ele só poderia estar falando com ela. Mas, como assim? Eles nem mesmo se conheciam! Ele não falou oi, não perguntou seu nome.
- Como assim, tipo de leitora?
- Bem, você poderia se encaixar na de “fantasiosos” ou na “temperamentais”.
- Desculpe, não estou entendendo aonde você quer chegar.
- Não quero chegar em lugar nenhum, ora!
Ficou pasma. Além de tudo, ele era rude! Ele deve ter percebido seu olhar de incredulidade, já que logo em seguida, falou novamente:
- Você lê vários livros de fantasia. Histórias de bruxos, dragões nórdicos, elfos e ogros. Logo, uma leitora fantasiosa. Mas também é bastante apegada a histórias de “amorzinho”, como costumo chamar esses livros água com açúcar que tem final óbvio.
Ela continuou calada, mal conseguindo acreditar no azar. Encontrar um desconhecido maníaco por classificar durante seu curto tempo livre? Sinceramente!
- Não concordo com essa sua classificação... Com licença, vou voltar para minha leitura em silêncio.
Ele saiu repentinamente, sem se despedir. Ela ficou feliz, afinal, teria paz novamente.
No dia seguinte, em cima do exemplar antigo de Contos Inacabados de Númenor e da terra média – um dos seus xodós – havia uma rosa. E um bilhete:
- Descobri qual tipo de leitora você é. Não é fantasiosa nem de amorzinho. Mas, acredite em mim... Você e eu podemos escrever uma história que supere qualquer uma.
Ao olhar para trás, bastante surpresa, se deparou de frente com ele, que disse:
- Para começarmos o esboço, que tal uma ida ao cinema hoje a noite?


You Might Also Like

1 Comentários

Posts mais vistos

Like us on Facebook

Flickr Images